Compartilhar

Alese abre ´Semana da Consciência Negra´ com programação especial voltada à valorização da história e da cultura afro-brasileira

Publicado em: 17/11/2025 20:14

A Assembleia Legislativa de Sergipe (Alese), por meio da Escola do Legislativo (Elese), iniciou nesta segunda-feira, 17, a Semana da Consciência Negra 2025 – “Presença, Permanência, Respeito e Afirmação”.

A programação, que segue até quarta-feira (19), no Auditório da Elese, tem como objetivo ampliar espaços de diálogo sobre a contribuição histórica, cultural e espiritual do povo negro na formação do Brasil, além de fortalecer ações de enfrentamento ao racismo e de valorização da identidade afro-brasileira.

Com atividades sempre às 9h, o evento reúne pesquisadores, artistas, mestres da cultura popular, educadores e estudantes da rede pública.

Abertura marcada pela força da ancestralidade

A abertura da Semana foi marcada por expressões de identidade e memória. O público foi recepcionado com a apresentação de Capoeira realizada pela Federação Sergipana de Capoeira e pelo Conselho de Mestres de Capoeira, que transformaram o auditório em um espaço de ancestralidade viva.

O Mestre “Preto Velho” emocionou o público ao compartilhar sua trajetória pessoal e sua compreensão da capoeira como legado histórico. Ele lembrou que iniciou na prática em 1979 e que, desde então, carrega consigo os ensinamentos e a responsabilidade de manter viva essa herança:

Mestre “Preto Velho”

“A capoeira foi uma luta de libertação dos negros e continua sendo uma forma de mostrarmos nossa cultura. Ela é luta, expressão corporal, cultura, lazer e esporte. Na época da escravidão, quem era pego vadeando era preso, deportado ou chicoteado. A capoeira era crime previsto no Código Penal. Com Mestre Bimba e Getúlio Vargas, ela saiu da criminalização e ganhou espaço nas escolas, nos quartéis e nas academias.”

Ele também reforçou a dimensão espiritual da prática:

“A capoeira carrega meus ancestrais. Quando eu passo pelo Quilombo dos Palmares, vejo milhares de capoeiristas reconectando-se a uma história que ainda pulsa. Por isso, é muito importante que a Alese abra este espaço. Estamos trazendo nossa cultura de volta para onde ela sempre pertenceu: ao povo.”

Na sequência, o cantor, pesquisador e palestrante Zeq’ Olliver apresentou a palestra “O Canto-Espiritual dos Negros no Brasil”. Ele destacou a importância dos cantos espirituais produzidos pelos negros escravizados como forma de resistência, esperança e expressão de humanidade durante os períodos mais duros da história.

Zeq’ Olliver

“O chamado ‘negro espírito’ é fruto da dor e da busca por libertação. Era a maneira encontrada para expressar o desejo de fugir do jugo da escravidão, muitas vezes por meio de uma crença profunda de que a verdadeira liberdade poderia vir de um plano espiritual. Esses cânticos influenciaram não apenas a comunidade negra, mas as diversas matizes de religiosidade e cultura do Brasil.”

Zeq’ Olliver enfatizou que a espiritualidade presente nesses cantos é universal:

“Deus não faz separação de raças. A espiritualidade pertence a todos. O que buscamos é reforçar o valor humano de cada pessoa, independente de cor, origem ou cultura. E a Consciência Negra é justamente isso: reconhecer o valor do negro na formação nacional e trazer esse orgulho à tona, especialmente para nós, negros, que tantas vezes fomos invisibilizados.”

Durante a abertura, também houve fala do coordenador de Assuntos Culturais da Elese, Beneti Nascimento, responsável pela curadoria do evento. Ele destacou a importância histórica desta edição:

Beneti Nascimento

“Este é o primeiro ano em que o feriado da Consciência Negra será celebrado nacionalmente. Aqui na Elese, reunimos cabeças pensantes, artistas, professores e estudiosos para três dias de reflexão e celebração. Teremos capoeira, teatro, poesia, música e, como novidade, uma chef que nos convidará a uma viagem pela culinária africana — comidas que fazem parte do nosso cotidiano, mas cuja origem muitos desconhecem.”

Beneti reforçou que a semana representa também uma oportunidade de reconexão:

“É uma viagem cultural e espiritual. Estamos nos reconectando com os negros que chegaram ao Brasil escravizados e que nos deixaram uma herança extraordinária. Mesmo após a maratona do Enem, esperamos estudantes e público em geral, porque esta semana não é apenas comemorativa, ela é formativa.”

A pedagoga, museóloga e bióloga Maria Hortência Santos encerrou as falas do primeiro dia com uma reflexão profunda sobre pertencimento e consciência:

Maria Hortência Santos

“A consciência negra é diária. Está nos nossos saberes, pertencimentos e falares. O Brasil teve 350 anos de escravidão e foi o último a abolir esse sistema, e ainda assim, entre aspas, porque o processo continua. Precisamos trabalhar essa consciência com as novas gerações, porque muitos não sabem que os negros que aqui chegaram eram reis, rainhas, detentores de cultura e espiritualidade.”

Ela também ressaltou a importância dos espaços sagrados e dos saberes culinários:

“A Casa Branca, em Salvador, tem mais de 150 anos. É o primeiro terreiro construído no Brasil. E a culinária de matriz africana tem um papel espiritual profundo. Nos terreiros, quem cozinha também come, porque a cozinha é um espaço sagrado. Há uma temporalidade, um saber que precisa ser preservado.”

Arte, religiosidade e gastronomia afro-brasileira

A programação segue nesta terça-feira (18), com a apresentação do grupo “Diversificartt – O Peso do Sagrado”, formado por alunos do Centro de Excelência Professor João Carlos de Souza. A performance trará elementos da ancestralidade, da religiosidade e da simbologia africana presentes no cotidiano das comunidades negras.

Em seguida, a chef Bianca Oliveira ministrará a palestra “A Comida que Veio da África”, mostrando sabores, técnicas e heranças que moldaram a culinária brasileira e reforçando sua dimensão cultural e espiritual.

Reflexão sobre luta contemporânea e enfrentamento ao racismo

O encerramento será realizado na quarta-feira (19), com a apresentação “Dança Sergipe – Entre a Cultura Ancestral e a Luta Contemporânea”, apresentada por estudantes do Centro de Excelência Atheneu Sergipense.

A última palestra da programação será “Diálogos sobre Racismo no Brasil: Perspectivas Históricas e Ações de Enfrentamento”, ministrada pela pesquisadora Rafaella Clarice Rodrigues Santos, que discutirá caminhos para o combate ao racismo estrutural.

Compromisso permanente

Com uma programação intensa, diversa e profundamente conectada à ancestralidade, a Assembleia Legislativa de Sergipe reafirma seu compromisso com a promoção da igualdade racial, da valorização da cultura negra e da construção de uma sociedade mais justa e plural.

A “Semana da Consciência Negra” segue até quarta-feira (19), aberta ao público e com entrada gratuita.

 

Fotos: Jadilson Simões / Agência de Notícias Alese

Fonte: Agência de Notícias do Estado de SE

Faça um comentário