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OAB/DF encerra congresso alertando a advocacia e a população sobre “Cuidados Estéticos e Segurança dos Pacientes”

A Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF) concluiu nesta sexta-feira (7) o “1º Congresso Brasiliense de Saúde, Bioética e Biodireito”. Organizado pela Comissão de Direito da Saúde, Bioética e Biodireito da OAB/DF, o evento de dois dias reuniu especialistas e promoveu discussões aprofundadas sobre temas essenciais que entrelaçam a saúde, a ética e o direito, desde o impacto da Inteligência Artificial até a segurança em procedimentos estéticos.
O encerramento foi marcado por abordagens detalhadas sobre “Cuidados Paliativos” e “Cuidados Estéticos e Segurança dos Pacientes”, refletindo a complexidade e a relevância desses assuntos no cenário atual da saúde e da sociedade.
*Entre a busca por beleza e a segurança do paciente*
O painel final do congresso, mediado por Thaís Maia, presidente da Comissão de Direito da Saúde, Bioética e Biodireito da OAB/DF, dedicou-se à delicada temática dos “Cuidados Estéticos e Segurança dos Pacientes”. As palestras foram conduzidas por Antônio Castelo Branco, cirurgião dentista e presidente da Comissão de Ética do Conselho Regional de Odontologia do Distrito Federal (CRO/DF), e Lívia Vanessa Ribeiro Gomes Pansera, médica infectologista e presidente do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM/DF).


Em sua apresentação, Antônio Castelo Branco abriu com a constatação de que o Brasil, ao lado dos EUA, lidera o ranking de países com maior número de procedimentos estéticos anuais. Ele pontuou que “a busca incessante por resultados estéticos, alimentada pela influência midiática, tem gerado frustrações, falhas técnicas e um expressivo aumento da judicialização na saúde.”
O cirurgião dentista abordou a crescente adesão de profissionais da odontologia a especializações que os habilitam a realizar procedimentos estéticos, sempre dentro de regras e limites claramente definidos. Ele citou as Resoluções do Conselho Federal de Odontologia (CFO) 198/2019 e 230/2020, frisando que o Poder Judiciário reafirmou a legalidade da Resolução CFO 198/2019, reconhecendo a Harmonização Orofacial (HOF) como especialidade odontológica e, assim, o direito de os cirurgiões-dentistas praticarem intervenções estéticas na face. A decisão, proferida pela 8ª Vara Federal do Distrito Federal, reconhece que a Odontologia já realiza procedimentos invasivos na região da face, especialmente na cirurgia e traumatologia buco-maxilo-facial.
Castelo Branco, no entanto, foi enfático ao encerrar sua apresentação, dizendo que a “segurança do paciente é o elo que une a técnica, a ética e o direito — e é isso que deve orientar toda intervenção estética, seja médica ou odontológica”.


Lívia Vanessa Ribeiro Gomes Pansera, em sua palestra intitulada “Segurança do Paciente em Procedimentos Estéticos”, enfatizou a intersecção entre Direito e Medicina neste campo, que envolve responsabilidade civil, penal e ética profissional. A médica alertou para a imperatividade de práticas seguras, que demandam protocolos rigorosos antes, durante e após cada procedimento.
Ela trouxe um panorama dos riscos em procedimentos estéticos e revelou dados preocupantes. Dentre as principais complicações identificadas em procedimentos inadequados, verificam-se a possibilidade de as pessoas serem acometidas por infecções bacterianas e fúngicas; necrose tecidual e comprometimento vascular; embolia e cegueira em preenchimentos; reações adversas graves e óbito. Dados da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) apontam que 17% das complicações geram sequelas permanentes.
Pansera destacou que o aumento de procedimentos realizados por profissionais não habilitados agrava significativamente o cenário de riscos em procedimentos estéticos, demandando maior fiscalização e rigor legal. Ela reforçou as diretrizes da SBD, que reitera que apenas médicos podem realizar procedimentos estéticos invasivos, sem exceções, e que a avaliação clínica prévia completa, ambiente seguro e registro detalhado em prontuário são indispensáveis.
A responsabilidade civil do profissional é configurada quando há culpa comprovada, e o dano estético, por sua natureza permanente e impacto psicológico, pode implicar responsabilidade solidária entre a clínica e o profissional executor.
Ambos os palestrantes convergiram na importância de que as pessoas busquem uma assistência adequada e se informem sobre o suporte para complicações ao escolher um profissional. Os Conselhos Regionais (CRM e CRO) cumprem papéis essenciais na regulação, fiscalização e punição da atividade profissional, além de realizarem campanhas de alerta e disponibilizarem informações sobre a regularidade dos profissionais em seus sites.
A discussão ressaltou a crescente preocupação com o “exagero” em procedimentos estéticos e a necessidade de redobrar a atenção à segurança. É fortemente recomendado que, antes de qualquer procedimento, as pessoas não se deixem levar pela “mercantilização”, ofertas de baixo custo que não incluem segurança alguma, ou pela influência de redes sociais, mas sim pesquisem a fundo a formação, especializações e condições do profissional e das instalações, e reflitam sobre a real necessidade da intervenção.
As redes sociais, alertaram os especialistas, podem acelerar e adoecer a autopercepção, promovendo padrões de beleza inatingíveis e impactando negativamente a busca por procedimentos.
A fiscalização é uma tarefa contínua, com órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) atuando, e os conselhos profissionais recebendo um grande volume de denúncias – o que gera um efeito colateral de dificultar a agilidade dos processos internos, que envolvem sindicância, investigação preliminar e, em casos graves, interdição cautelar.
Memória do Segundo Dia: O Direito Fundamental aos Cuidados Paliativos
A manhã do segundo dia do congresso também foi dedicada aos “Cuidados Paliativos”, um direito humano fundamental que busca melhorar a qualidade de vida de pacientes e suas famílias diante de doenças que ameaçam a vida. As palestras foram conduzidas por Cristiane Cordeiro, médica paliativista da SES/DF, e Gabriela Hidalgo, médica paliativista e consultora técnica no Ministério da Saúde (MS).
Cristiane Cordeiro destacou que, globalmente, mais de 40 milhões de pessoas necessitam de cuidados paliativos anualmente, mas apenas 14% os recebem. No Brasil, o “Atlas dos Cuidados Paliativos” da ANCP, com dados de 2022, mostra um crescimento na oferta, mas uma distribuição desigual, com o Sudeste concentrando a maior parte dos serviços. A médica ressaltou que, apesar do aumento na oferta pelo SUS, o país ainda está muito aquém do ideal, oferecendo, em média, apenas um serviço para cada 1,6 milhão de habitantes, e enfrenta desafios no acesso a medicamentos essenciais para o alívio da dor.
Gabriela Hidalgo abordou a recente Política Nacional de Cuidados Paliativos, instituída em maio de 2024, ressaltando a importância de desmistificar o conceito de paliativo, que significa “manto protetor” e não “fim da linha”. Ela defendeu o início precoce desses cuidados, já no diagnóstico da doença, e não apenas no fim da vida, exemplificando que mesmo pacientes com diagnósticos de câncer em fase inicial podem necessitar de apoio paliativo. A política nacional busca desenvolver os cuidados paliativos em todos os pontos da rede de saúde, priorizando a atenção primária e o cuidado domiciliar, em consonância com princípios como a valorização da vida e o respeito à dignidade.
Primeiro Dia: Inteligência Artificial na Saúde e Seus Desafios
O “1º Congresso Brasiliense de Saúde, Bioética e Biodireito” iniciou na quinta-feira (6) com debates sobre a aplicação da Inteligência Artificial (IA) na medicina e no direito. Especialistas exploraram os desafios e oportunidades que a IA oferece, enfatizando que a tecnologia deve atuar como uma aliada do olhar humano, potencializando o discernimento e a ética dos profissionais.
As discussões abordaram questões como a responsabilidade civil, penal e ética profissional em cenários de uso da IA, a necessidade de regulamentação, e os riscos de viés algorítmico, automação complacente e o aprofundamento do abismo digital. Os palestrantes convergiram na ideia de que a IA é uma ferramenta poderosa, mas que o julgamento clínico e a empatia humana permanecem insubstituíveis, exigindo um desenvolvimento e implementação guiados por princípios éticos e de segurança.
A OAB/DF, através de sua Comissão de Direito da Saúde, Bioética e Biodireito, reafirma seu compromisso em promover o diálogo interinstitucional e interdisciplinar, buscando aprimorar as práticas jurídicas e de saúde para o bem-estar da sociedade.
Fotos: Luiz Júnior
Jornalismo OAB/DF

