Udesc Cefid avalia impactos da qualidade do ar em quem faz atividades físicas

Publicado em: 23/10/2025 23:30

Florianópolis é a capital fitness do Brasil. A maior população ativa do país, segundo o Ministério da Saúde, tem a seu favor uma série de atrativos naturais, motivação extra para a prática de atividades físicas ao ar livre. Já para quem prefere academias, opções não faltam. Em 2024, o mercado nacional expandiu-se para mais de 64 mil empresas.

Mas a alta procura por práticas saudáveis nem sempre acompanha a preocupação com a qualidade do ar daquele ambiente, seja ele aberto ou fechado.

Na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), pesquisadores vinculados ao Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (Lape), no Programa de Pós-Graduação em CIências do Movimento Humano (PPGCMH), do Centro de Ciências da Saúde e do Esporte (Cefid), estudam há mais de uma década os efeitos de poluentes sobre a atividade física, sob coordenação do professor Alexandro Andrade, referência internacional da área.

Por um lado, os benefícios dos exercícios ainda superam em larga escala os riscos de ambientes poluídos, afirma Fábio Dominski, pesquisador do laboratório e autor de tese de doutorado sobre a qualidade do ar.

Mas alguns grupos mais vulneráveis precisam redobrar os cuidados. É o caso de crianças, idosos e portadores de doença cardíaca ou respiratória, que podem ter o quadro agravado dependendo do tipo e nível da poluição atmosférica.

Diante deste cenário, algumas medidas preventivas devem ser tomadas, alerta o professor Alexandro Andrade. Estudos do Lape fornecem evidências científicas úteis para praticantes de esportes, exercícios e empresários do ramo fitness.

Ventilação natural 

O primeiro alerta é para as academias: deve-se investir em mais ventilação natural, já que o ar-condicionado do tipo split faz somente a recirculação do ar. Ambientes pouco ventilados facilitam a presença de patógenos e aumentam o risco de infecções como a gripe, conclui pesquisa do Lape publicada em 2018.

Dois anos depois, o estudo ganhou repercussão mundial após ser mencionado pelo jornal The New York Times durante a pandemia de Covid-19. Para o professor Alexandro, é uma forma de reconhecimento que impulsionou o alcance da Udesc como universidade comprometida com o enfrentamento da crise sanitária.

Portas e janelas abertas também são importantes para diminuir o nível de dióxido de carbono (CO₂). Pesquisadores do laboratório descobriram, em três academias de Florianópolis, que a alta concentração do poluente está associada a alterações no humor dos praticantes.

Quem treina em boxes de crossfit também deve estar atento para as recomendações. O ato de soltar a barra de levantamento com força, prática comum entre os adeptos da modalidade, pode dispersar partículas de poeira que estavam depositadas no chão.

“Esse material volta a ficar em suspensão no ar e pode ser inalado tanto pelos praticantes quanto pelos professores, representando um fator de atenção para a qualidade do ar no ambiente”, explica Rubia Truppel dos Santos, pesquisadora do Lape cuja dissertação de mestrado investigou academias de crossfit.

Para fazer a coleta e análise dos materiais, o Lape utiliza tecnologia de ponta. Três sensores, adquiridos com recursos da Udesc e da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc), monitoram a concentração de nanopartículas decorrentes da queima de material orgânico. Sensores de material particulado e gases também completam o conjunto de equipamentos.

Sonolência na sala de aula

Além das academias, o Lape avaliou a qualidade do ar em outros ambientes fechados, como clínicas hospitalares e escolas.

A tese de doutorado de Joaquim Branco verificou que os efeitos de poluentes atingem até mesmo centros de saúde, como a Clínica Escola de Fisioterapia, localizada na Udesc Cefid, no campus do bairro Coqueiros, em Florianópolis.

Os dados sugerem alternativas para a diminuição de gastos públicos na saúde.

“A garantia de ambientes mais seguros e saudáveis pode contribuir não apenas para a eficácia dos programas de reabilitação pulmonar, mas também para a redução da carga de sintomas respiratórios, da utilização dos serviços de saúde e, consequentemente, dos custos associados ao tratamento de doenças crônicas”, avalia Joaquim.

Nas salas de aula, o alto nível de dióxido de carbono impacta a sonolência de estudantes. Desenvolvido na Itália, em parceria com pesquisadores da Universidade de Cassino e do Lazio Meridionalo estudo da Udesc comprova que a ventilação inadequada prejudica a atenção e o desenvolvimento cognitivo.

São resultados que auxiliam a orientar decisões de planejamento urbano. É preferível construir escolas e hospitais longe de indústrias e ruas com tráfego intenso, pois são regiões mais suscetíveis ao acúmulo de CO₂, conclui outra pesquisa do Lape em cooperação internacional.

Queimadas

Em 2024, o Governo do Estado de Santa Catarina emitiu alerta sobre os riscos da poluição atmosférica sobre a saúde pública. Florianópolis chegou a ser considerada a sexta capital com pior qualidade do ar durante a semana de queimadas, em setembro, segundo monitoramento da empresa suíça IQAir.

Isso não impediu que dezenas de adeptos da vida fitness saíssem para praticar exercícios ao ar livre no mês de setembro do último ano, quando houve o ápice dos incêndios e queimadas no país. O fluxo de pessoas chamou a atenção do professor Alexandro Andrade, que iniciou um novo projeto de pesquisa.

“Basta olhar a quantidade de pessoas idosas que fazem exercícios na Avenida Beira-Mar Norte. Eles estão respirando o ar ao lado do maior fluxo de automóveis do estado”, assinala o coordenador do Lape.

“Minha hipótese é que a poluição do ar altera significativamente a resposta psicológica e a saúde mental do praticante de exercício, dependendo das condições ambientais na qual ele está inserido”, completa o docente.

Os riscos associados às queimadas estão presentes mesmo quando elas não ocorrem diretamente no local, já que os efeitos da poluição são transportados pela massa de ar.

“Alguém que sai para correr ou pedalar em um dia de céu tomado pela fumaça das queimadas pode estar se expondo a riscos significativos sem perceber”, adverte Willy Mackoviak, aluno do 5º semestre do curso de Licenciatura em Educação Física e bolsista de iniciação científica do Lape no projeto sobre o impacto das queimadas na qualidade do ar.

Praticantes de exercícios moderados e intensos começam a respirar pela boca quando estão ofegantes. Sem os filtros purificadores do nariz, responsáveis por reter sujeira, as nanopartículas das queimadas entram mais facilmente no corpo humano. Podem atravessar os alvéolos pulmonares e cair diretamente na corrente sanguínea, agravando doenças respiratórias, explica o professor Alexandro.

Nos próximos meses, o laboratório continuará medindo a quantidade de poluentes para ampliar o escopo da pesquisa. Futuramente, também pretendem aferir a qualidade do ar em locais públicos de Florianópolis utilizados para a prática de exercícios ao ar livre.

Trabalho a muitas mãos

O Lape foi o primeiro núcleo de pesquisa formado na Udesc Cefid, com atuação há mais de 35 anos. Uma das inspirações para a criação da linha de pesquisa sobre a qualidade do ar, em 2014, foi o contato do professor Alexandro Andrade com a tese de doutorado do engenheiro mecânico Marcelo Pereira, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC), sobre hospitais. Atualmente, estudos do Lape na área de fisioterapia respiratória são produzidas em colaboração com o professor Darlan Matteda Udesc Cefid.

A linha de pesquisa foi consolidada pela cooperação científica internacional com o professor Giorgio Buonanno, da Universidade de Cassino de Lazio, na Itália, na qual Andrade é professor e pesquisador visitante. Também atua na pós-graduação da Universidade de Coimbra desde 2019, em Portugal, em trabalho junto a o professor Manuel Gameiro da Silva.

Embora estudos sobre qualidade do ar sejam comuns às engenharias, o Lape é pioneiro nas ciências do esporte por relacionar seus efeitos aos praticantes de exercícios físicos. Mais recentemente, estão observando os impactos sobre grupos populacionais específicos, como idosos, o que resultou na dissertação de mestrado defendida por Anderson D’Oliveira.

Além da qualidade do ar, o Lape desenvolve estudos que analisam os efeitos de atividades físicas sobre pacientes com fibromialgia, doenças reumáticas e sobreviventes do câncer de mama. Também utilizam jogos digitais interativos (exergames) para incentivar o interesse de diferentes populações por exercícios.

Atualmente, a equipe é formada por 35 pesquisadores, entre bolsistas de iniciação científica da graduação, alunos de mestrado, doutorado, pós-doutorado e professores colaboradores no país e exterior.

“É um grande laboratório consolidado, com algumas linhas de pesquisa. Meus alunos e orientandos são educados para a colaboração no trabalho científico de qualidade, em parceria, respeito acadêmico e social. Essa é a característica e o DNA do Lape”, reconhece o coordenador .

Com os próximos estudos sobre qualidade do ar, os pesquisadores esperam obter evidências científicas ainda mais robustas para a construção de políticas públicas voltadas à saúde da população catarinense, com amplitude global.

Contate o coordenador

Alexandro Andrade é professor titular e permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano, vinculado ao Centro de Ciências da Saúde e do Esporte (Cefid) da Udesc, e coordenador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (Lape).

É bolsista de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Tem sido reconhecido como um dos pesquisadores mais influentes do mundo na ciência nos rankings internacionais. Atua nos seguintes temas: psicologia do esporte, desempenho no esporte, psicologia do exercício, atividade física e saúde, qualidade do ar e poluição no exercício e no esporte.

E-mailalexandro.andrade@udesc.br.

Este texto integra o projeto Udesc+Ciência, produzido pela Secretaria de Comunicação da Udesc e com apoio da Fapesc.

Assessoria de Comunicação da Udesc
Jornalista Dairan Paul
E-mail: comunicacao@udesc.br
Telefone: (48) 3664-8006

Fonte: Agência de Notícias do Estado de SC

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