Prevenção à Violência na Primeira Infância: SES vai ampliar assistência especializada nos hospitais

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Prevenção à Violência na Primeira Infância: SES vai ampliar assistência especializada nos hospitais

15 de outubro de 2020

 
A Semana Nacional de Prevenção à Violência na Primeira Infância, de 12 a 18 de outubro, que foi instituída pelo Congresso Nacional por meio de lei, em 2007, visa conscientizar a sociedade sobre as verdadeiras causas do problema e suas possíveis soluções. A Secretaria de Estado de Saúde (SES) alerta para a necessidade de atuação de toda a comunidade para evitar novos casos e preservar essa parte da população mais vulnerável.

A primeira infância vai do nascimento até os seis anos e é a fase em que os maus-tratos impactam ainda mais a formação da pessoa, principalmente no primeiro ano de vida. No primeiro semestre de 2019, 2.457 agressões a crianças na primeira infância foram registradas no Estado do Rio de Janeiro. No primeiro semestre de 2020, o número caiu para 1.657 notificações. Eralda Ferreira, coordenadora de Vigilância e Promoção da Saúde da Secretaria, explica que a diminuição nas notificações não corresponde a queda na violência.

– O fato de não haver a notificação não significa que não aconteceu. Algumas violências não são percebidas e a recomendação de não sair de casa impediu que outras pessoas percebessem os sinais nessas crianças – afirma Eralda.

É em casa onde a maior parte da violência acontece. No estado do Rio, as agressões a crianças e adolescentes em residências eram 58%, em 2019, e aumentaram para 65% em 2020. A pandemia potencializou o problema, pois o convívio doméstico aumentou, expondo ainda mais as crianças às agressões.

– É importante considerar que a escola protege de alguma forma, na medida em que pode alertar sobre a suspeita – aponta a médica pediatra Fernanda Fialho, membro da Área Técnica de Saúde da Criança da SES.

Agravando ainda mais o quadro, devido ao risco de contágio, a diminuição da procura pelos serviços de saúde, principal local onde a agressão é percebida, levou à subnotificação. Em janeiro deste ano, houve um aumento de 36,64% nas notificações em relação ao mesmo mês de 2019. Em fevereiro, começou a queda, que chegou a 33,17% em abril.

– Em meados de março iniciaram-se no estado as medidas de isolamento social e alteração na rotina dos serviços de saúde em razão da Covid-19, o que justifica o declínio expressivo de notificações. Mesmo com as medidas sanitárias vigentes, no mês de junho as notificações começaram a aumentar, possivelmente devido ao início da flexibilização, sendo ainda 56,48% menores do que as de junho de 2019 – esclarece Eralda.

Atento à nova realidade, o Núcleo Estadual de Saúde para Prevenção às Violências publicou uma Nota Técnica voltada para profissionais de saúde com um conjunto de recomendações para a atenção em situação de violência doméstica no contexto da pandemia.

– É necessário sensibilizar o profissional de saúde para notificar casos ainda suspeitos e construir a percepção de que a notificação é um disparador de cuidado, que sinaliza a necessidade de um olhar – argumenta Fernanda, que coordena o Núcleo.

A iniciativa há um ano e meio reúne todas as áreas técnicas da SES que tratam da violência, como descreve a médica.

– É uma pauta de todo mundo. O Núcleo virou uma grande potência, referência e incentivo para os municípios, inclusive para criação de políticas públicas, e responsável por articular ações para o enfrentamento e prevenção. A demanda é grande, mas persistimos na busca pela promoção da cultura de paz como meta – diz

O plano da SES é ampliar a assistência especializada nas unidades hospitalares. Entre as ações do Núcleo, houve a criação do protocolo que propõe que toda vítima de violência deva receber a classificação laranja, sendo atendida em até 10 minutos por uma equipe multiprofissional, composta por assistente social, enfermeiro, psicólogo e médico. A medida diminui a exposição do paciente e evita que precise ser questionado repetidas vezes por diferentes especialistas.

O Hospital Estadual Azevedo Lima, em Niterói, uma unidade que é referência em atendimento à vítima de violência, trabalha com o protocolo laranja e acolhimento imediato com equipe multiprofissional. De março a setembro, 10 crianças na primeira infância vítimas de violência foram atendidas na unidade, incluindo um recém-nascido vítima de negligência.

Quanto menor a idade, maior a vulnerabilidade

 Em 2019, as notificações de violência contra crianças na primeira infância corresponderam a 17% do total nos serviços de saúde de todo o estado. Meninos e meninas foram vítimas na mesma proporção.

– Quando olhamos as faixas etárias compreendidas na primeira infância, as crianças menores de 1 ano destacam-se com 28,1% do total, seguidas por crianças de 1 ano com 28,3% e crianças de 2 anos com 14,5% do total. Podemos concluir que quanto menor a criança mais exposta aos riscos de violências ela está – informa Eralda.

A negligência e o abandono são o tipo de violência mais comum, aparecendo em 74% das notificações, seguido de violência sexual (11%) e física (10%). O local de ocorrência das violências contra crianças nesta faixa etária é a residência em 33% dos casos. A maior parte dos encaminhamentos foi feita para a rede de saúde, em 66% das notificações, e para o Conselho Tutelar, em 39% das situações. Entre as vítimas, 71% são negras.

Um dos principais fatores agravantes da violência contra menores é o álcool, um gatilho para o comportamento violento que está presente em 14% das agressões a crianças e adolescentes notificadas nos últimos quatro anos. Por essa razão, a atenção ao consumo de álcool para intervir na ocorrência de acidentes e violências será estratégia da SES para a redução desses agravos.

O que pode ser feito pela sociedade

 A Política Nacional de Promoção da Saúde destaca ações preventivas e ressalta que a participação deve ser coletiva, envolvendo instituições de educação e ensino, associações, grupos formais e informais e lideranças comunitárias e juvenis, dentre outros, como parceiros fundamentais. O trabalho deve começar já no pré-natal, desenvolvendo a aceitação da gravidez não planejada ou em decorrência de violência e as expectativas em relação ao bebê. A promoção de vínculos afetivos e de cuidado é o melhor caminho nesse momento.

O ideal é perceber a violência o quanto antes, para que não chegue ao extremo. Para isso, Eralda ressalta a necessidade de buscar compreender a criança.

– Ter sempre um olhar acolhedor e sensível é imprescindível. Somos todos responsáveis e devemos ser parceiros para prevenir, denunciar e intervir. A forma de comunicar é diferente. A criança que não está bem pode estar querendo expressar alguma coisa. Quando apresenta muitas queixas, reclama muito, pode não ser manha, mas talvez precise ser vista. Pode ser sinal de violência, e é importante estar atento ao chamado – afirma.  

Fernanda enumera outros pontos que devem servir de alerta: “Lesões sem qualquer explicação, ou incompatíveis com a fase de desenvolvimento da criança, como uma criança de meses, que ainda não anda, com a perna quebrada, ou choro muito constante são alguns sinais que devem ter atenção”.

Há ainda a cultura da palmada, que deve ser combatida:

– Em nenhuma condição é aceitável que o adulto agrida a criança. É sempre uma covardia, que gera uma escalada de violência. Pode começar com uma sacudidela e evoluir para algo pior – disse.

A médica sinaliza sobre a importância do cuidado integral:

– A violência doméstica caminha junto. É importante que toda a família seja assistida porque geralmente a criança não é a única vítima. Portanto, situações familiares como perda de emprego, uso abusivo de álcool e outras drogas e separação conjugal podem demandar ajuda para a família lidar com as adversidades evitando a violência – afirma.  

Fonte: Governo RJ