Criada em 2014, a Operação Lava Jato é um conjunto de ações da Polícia Federal (PF) que investigam esquemas de lavagem de dinheiro que teriam movimentado bilhões de reais em pagamento de propina.
A operação foi uma das responsáveis por desestabilizar o governo de Dilma Rousseff e levou políticos e empresários a serem investigados e presos. Entretanto, os dias da operação podem estar contados.
Isso porque a portaria que criou a força-tarefa da Lava Jato expira em agosto, cabendo ao Procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras, renovar a operação por mais um ano, como foi feito em outras cinco oportunidades. Entretanto, fontes da Lava Jato dizem que Aras não tem a intenção de renovar a operação até 2021. Mas afinal, onde o atrito entre o órgão e a operação começou?
O conflito
O embate entre a equipe da Lava Jato e a PGR começou quando, entre os dias 23 e 25 de junho, a subprocuradora-gera da República Lindôra Araújo visitou os escritórios da força-tarefa no Paraná e pediu acesso a documentos sigilosos da operação.
O pedido gerou incômodo nos membros da equipe da força-tarefa, que fizeram uma queixa à Corregedoria do MPF. Em contrapartida, segundo o jornal O GLOBO, a PGR disse que a visita de Lindôra estava marcada há mais de um mês.
Em nota divulgada após a visita da subprocuradora, a PGR também afirmou que estranhou a “a reação dos procuradores e a divulgação dos temas, internos e sigilosos, para a imprensa”.
Sergio Moro
Agora ex-ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro, Sergio Moro foi juiz da Lava Jato entre 2014 e 2018, sendo um dos principais nomes da operação. Desde que os atritos começaram, o magistrado se posicionou a favor da continuidade da Força-Tarefa e contra um eventual encerramento das atividades.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Moro disse que ‘não entende’ as propostas de revisionismo da Lava Jato. “Não entendo essa lógica do revisionismo, como se a Lava Jato não representou algo extremamente positivo, que foi uma grande vitória contra a impunidade da grande corrupção. Quem ataca a Lava Jato hoje eu sinceramente não entendo bem onde quer chegar”, disse o ex-ministro.
Na ocasião, Moro também disse que respeita Aras, mas que acredita que falta apoio do PGR às ações da PF. “Tenho respeito ao Augusto Aras, seria importante que ele refletisse um pouco mais, ele e também a cúpula da Procuradoria. Ele tem que se somar a esses esforços das forças-tarefa da Lava Jato e de demais forças que certamente terão que ser criadas”, completou o magistrado.
Além disso, o ex-ministro também utilizou suas redes para dizer que o Brasil vive um momento “anti Lava Jato”.
Moro, Bolsonaro e corrupção
O combate à corrupção foi uma das principais bandeiras da campanha eleitoral de Jair Bolsonaro. Ao nomear Sergio Moro para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, Bolsonaro acenava à sua base eleitoral, que via no juiz uma figura de herói. Entretanto, ao deixar o governo, Moro pode ter criado situações adversas para o governo Bolsonaro. A principal delas, é o enfraquecimento da Lava Jato.
Para Pedro Fassoni Arruda, cientista político e professor da PUC/SP, a saída de Moro do governo Bolsonaro pode contribuir para o fim da Operação Lava Jato. Segundo ele, a operação vem sendo enfraquecida ao longos dos últimos anos por uma séries de motivos, entre os quais está a saída de Moro do ministério da Justiça e Segurança Pública.
“O ponto principal da Lava Jato foi a condenação e a prisão do ex-presidente Lula e depois, gradualmente, a Operação Lava Jato foi ficando cada vez mais distante dos holofotes da mídia, chamando cada vez menos atenção e perdeu bastante apoio da população e até mesmo no meio jurídico depois que se descobriu o conluio entre Ministério Público Federal e a Justiça Federal de Curitiba.”, afirma Pedro.
Entretanto, o cientista reafirma que o eventual fim da Lava Jato se deve, também, a outros fatores. “esse processo já vinha, gradualmente, perdendo força e agora, com a saída do Sergio Moro, isso pode contribuir pro fim da Lava Jato. Claro que isso não é uma explicação unicausal porque tem muitos outros fatores que ajudam a explicar. Além desse, o próprio fato de que algumas iniciativas foram invertidas pela Justiça. Muitas condenações foram anuladas em outras instâncias. Isso pode facilitar também o fim da operação lava jato.”, completou.
Outro ponto a ser levado em conta são as consequências da saída de Moro e a perda de apoio de Bolsonaro. Ao comentar sobre possível essa possível perda após a saída de Moro e seus desdobramentos, Pedro diz que, apesar de condenar, no campo retórico, práticas ilícitas, o presidente, seus familiares e membros do alto escalão do governo estão envolvidos em irregularidades. E, segundo ele, a tentativa de tentar proteger seus filhos motivou a saída de Moro e pode acarretar em perda de apoio.
“O Bolsonaro vinha falando em combater a corrupção durante a campanha eleitoral. Mas agora fica cada vez mais evidente que ele também estava envolvido em práticas ilícitas que ele mesmo condenava. A saída do Sergio Moro, sem dúvida, contribui para que ele (Bolsonaro) perca apoio. Até mesmo porque a motivação desta demissão do Moro foi o fato de que o Bolsonaro queria exercer um controle maior sobre o Ministério da Justiça e sobre a Polícia Federal para proteger os seus filhos”, concluiu.
Porque não renovar?
Apesar do atrito entre o órgão e a força-tarefa, Aras não se pronunciou sobre o caso e nem deu indícios públicos sobre qual será sua decisão. Entretanto, um dos motivos pelos quais o PGR estaria cogitando encerrar a Lava Jato seria a proposta de criar um novo órgão de combate à corrupção dentro do Ministério Público Federal (MPF).
Nomeado Unidade Nacional Anticorrupção (Unac), o órgão pertenceria ao MPF, seria coordenado por um membro da PGR e iria unificar forças-tarefas de combate à corrupção em um único local. Dados obtidos pelas investigações seriam disponibilizados para agentes da Unac.
A proposta da criação do órgão teria sido feita por dois subprocuradores que pertencem ao Conselho Superior da PGR.