1988, Atibaia, São Paulo. “Eu com 15 e ele com 19. Ele alugou apartamento, tinha 3 empregos, deixou tudo certo. No dia 10 de janeiro fugi de casa. Arrumei minhas coisas escondido, pois minha família não aceitava de forma nenhuma a relação, para todos éramos irmãos”. Sendo assim, deixei uma carta para minha mãe e em plena madrugada pulei a janela e fui de encontro ao amor da minha vida, que estava em um Fiat 147 cheio de bagagens”, conta Sandra Cardoso, protagonista dessa história.
Poderia ser o enredo de uma novela, mas é uma história real. Ela começou quando Sandra tinha 12 anos quando ela e a mãe foram morar com o homem que ela considerava seu pai e o filho dele, que viria se tornar seu marido. “O meu então irmão, Beto, tinha 16 anos e era fruto do primeiro casamento do meu ‘pai’, até então eu acreditava que erámos irmãos de pai, mas a história não é bem assim”, conta.
“Quando encontrei com ele a primeira vez, senti algo diferente. Mas como eu tinha apenas 12 anos e ele era meu irmão até então, não soube identificar o que sentia. Foram momentos incríveis e eu o admirava muito. Ele era um rapaz lindo e responsável, que trabalhava e estudava”, recorda.
Quando seu irmão de criação começou a namorar os sentimentos de Sandra foram ganhando forma. “Ele começou a sair pela cidade, a namorar outras moças e eu comecei a perceber sentimentos de ciúmes, mas eu também tinha meus namoricos e ele não ficava confortável com os relacionamentos”, conta.
Até que um belo dia, o inevitável aconteceu. “Ficávamos conversando por horas, um dia, nos beijamos. Estávamos deitados no chão da sala conversando e rolou o beijo, ficou tudo estranho. Eu me perguntava: ‘como assim, ele é meu irmão!'”, afirma.
Mesmo sentindo que era algo errado, Sandra sabia que faltava algo na história dela. “Não sei, até então erámos irmãos, mas parecia que faltava alguma peça para completar a minha história”, conta. Beto resolveu romper o namoro logo depois. “Ele se sentia mal e com medo do nosso ‘pai’ descobrir e de tudo que poderia acontecer, perdi meu chão mas entendi a aflição dele.
Os dois voltaram a ter namoricos com outras pessoas na esperança de superar, mas o amor era mais forte. “Depois de um tempo, voltamos a ficar juntos e de forma mais intensa. Nessa retomada muitas coisas aconteceram. Nosso pai descobriu que estávamos nos relacionando. Daí ficou tudo mais difícil e complicado. O Beto saiu de casa, foi morar com a avó, na mesma cidade, mas longe de mim”.
Mesmo com todas as dificuldades e impecilhos, os dois continuaram se encontrando durante meses. Como a situação ficou insustentável, Sandra com 15 e Beto com 19 tiveram uma ideia. “Um dia ele perguntou se eu iria embora com ele, sem pensar disse que sim. Deixei tudo organizado e fui. O destino era Santos e eu desci a serra em prantos, pois apesar da vontade de estar naquele momento, minha vida toda ficou para trás”, afirma.
No caminho, os namorados fugitivos foram parados pela Polícia Rodoviária. Beto contou tudo com medo de ser algum policial chamado pelo pai, já que ele tinha influência na cidade. Mas segundo o casal, o policial liberou os dois desejando boa sorte.
A mãe de Beto, que morava em Santos na época, os ajudou a organizar a vida na nova cidade. “Ela nos recebeu muito bem, nos orientou e apesar de ser incrível, não era conivente com nossas atitudes. Nosso ‘pai’ já havia ligado para ela e ameaçava chamar a polícia, pois o Beto já era maior de idade”, diz.
O casal seguiu a vida a dois. Mas neste meio tempo ela descobriu algumas coisas que a ajudaram a montar o quebra-cabeça de suas história. “Quando fui para Santos, tive acesso a passagens da minha vida que desconhecia, por exemplo: algumas pessoas diziam que o pai dele conheceu minha mãe quando eu já tinha 3 meses de idade, outros diziam que eu era filha de outro casamento, mas que era proibido o assunto, eu não entendia. A mãe do Beto viveu com o pai dele até os 14 anos dele, mas eu já tinha 10 anos, ou seja: não fazia sentido”, conta.
Ao confirmar que os dois realmente não eram irmãos, seis meses após a fuga Sandra ficou grávida do primeiro filho. “Em março de 1990 ele veio ao mundo, lindo e perfeito. Eu tinha 16 e o Beto 20.
Passado o nascimento do filho, a família começou a se aproximar novamente. Fazia 1 ano que eles estavam longe de casa. Voltamos para Atibaia de visita, com nosso filho e ali tudo recomeçou”, afirma.
Hoje, com três filhos fruto da união com Beto e um quarto de outro relacionamento dele, o casal segue juntos e felizes há mais de 30 anos. Ela encontrou seu pai biológico e a família paterna. A relação com o homem que ela achava que era seu pai – o pai de Beto – hoje é mais saudável, mas mesmo assim ele não aprova o relacionamento.