Às margens do Lago Paranoá, no Setor de Hotéis e Turismo Norte, o Museu de Arte de Brasília (MAB) nasceu praticamente junto com a cidade, por volta de 1959, quando as obras de um e de outra começaram. Mas Brasília “nasceu” antes, em 21 de abril de 1960, enquanto o prédio do MAB foi inaugurado em 1961.
Antes de ser um dos espaços culturais mais charmosos da capital federal, no entanto, o lugar – prestes a ser reinaugurado após 13 anos fechado – serviu de anexo para o Brasília Palace Hotel, para o clube das Forças Armadas e, veja só, até para um casarão do samba.
Só em 1985 virou galeria de um acervo invejável de obras raras. A nova estrutura irá obedecer às necessidades de segurança e acessibilidade, com dois elevadores para cadeirantes. Com isso, as pessoas com deficiência poderão ter acesso ao pavimento superior do prédio.
“A gente quer resgatar aquilo que o MAB foi concebido para ser, ou seja, um grande celeiro de ideias onde o artista possa pintar o sete, literalmente”Bartolomeu Rodrigues, secretário de Cultura e Economia Criativa
No que diz respeito ao espaço e ao acervo, a novidade será a disponibilidade de uma reserva técnica com quase 600 metros quadrados, que não tinha, e laboratório de restauro e conservação novos, além de sala de triagem para receber e avaliar as obras. “Esse ambiente conta com sistema de combate a incêndio, dutos de ar condicionado para refrigerar e detectores de fumaça para avisar com antecedência um possível fogo”, detalha Thales Yorran, um dos engenheiros responsáveis pela obra.
“A gente quer resgatar aquilo que o MAB foi concebido para ser, ou seja, um grande celeiro de ideias, um lugar onde o artista possa pintar o sete, literalmente”, festeja o secretário de Cultura e Economia Criativa do DF, Bartolomeu Rodrigues. “O nosso desejo é fazer do espaço um conceito diferente dos outros museus, onde as pessoas vão contemplar obra de arte, mas que ali também aconteçam oficinas integradas com o mundo acadêmico”, diz o secretário.
Para quem conheceu o que era o prédio do MAB antes e o que será hoje, o projeto de revitalização do local é, no mínimo, apaixonante. O novo prédio, antecipa o secretário de cultura, não vai deixar nada a desejar para o que há de mais moderno em termos de concepção de obra pública para instalação do gênero.
Um dos principais destaques da obra são os sistemas de climatização – fundamental para o funcionamento de um museu -, e de energia solar. Toda a cobertura da construção irá captar a chuva para jogá-la nos tubos que vão até os reservatórios de águas pluviais no subsolo. O conteúdo será aproveitado para irrigação dos jardins. “Será um projeto autossustentável”, explica Bartolomeu.
Haverá ainda uma passagem subterrânea que fará a ligação direta com a reserva técnica do museu e novas paredes de cobogós na parte inferior do prédio que se somam ao projeto original da fachada superior.
Circundando o museu, terão gramas e árvores destacadas por luzes que vão fazer a integração entre a natureza e o concreto que tanto marca a arquitetura moderna de Brasília. “O desejo é fazer do MAB um conceito diferente do Museu da República”, diz Bartô, apelido do secretário.
Ainda sem data, a exposição inaugural, que servirá de base para uma montagem de longa duração contando a História da Arte de Brasília, já está em fase avançada de elaboração. A ideia, segundo o subsecretário de Patrimônio Cultural da Secretaria de Cultura do DF, Demétrio Carneiro, responsável pelo acervo do MAB, é que o espaço passe a abranger também a História do Design da capital.
Para isso, o acervo contará com peças históricas, como por exemplo, do arquiteto Sérgio Rodrigues (1927-2014), assim como artigos de outros designers contemporâneos. Alguns desses trabalhos são premiados internacionalmente.
“Além de acrescentar à sua proposta de trabalho os móveis autorais da indústria moveleira da cidade, o MAB irá também fazer o mesmo com a produção de ladrilhos local, fazendo do espaço o maior em obras identitárias do DF”, defende Demétrio.
Para Bartolomeu Rodrigues, a reinauguração do Museu de Arte de Brasília será a ponta de um projeto mais ambicioso ainda – a consolidação de um complexo cultural que vai do museu até a Concha Acústica. Para que a ideia ganhe forma, um grupo de trabalho envolvendo as secretarias de Cultura, Desenvolvimento Urbano e Obras, com a Novacap, foi formado.
“O governador ainda vai anunciar formalmente, mas queremos aproveitar a reinauguração do MAB e transformar toda essa área num complexo cultural, inclusive, a Concha Acústica, que é outro equipamento nosso importantíssimo que está subvalorizado”, comenta.
“Ainda não temos nome, para o complexo, é um projeto que está sendo desenhado, é um espaço que precisa ser mais valorizado no pós-pandemia, para levantar a cidade”, planeja. A previsão de entrega do “novo MAB” é para esse semestre. A obra será executada pela Novacap, tem recursos do Banco do Brasil e da Terracap na ordem de R$ 10 milhões.
Importância inegável
A história do MAB é cercada de mistérios e desencontros. É o que conta a arquiteta e pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB), Maíra Oliveira Guimarães, especialista em patrimônio arquitetônico, desde 2015, se debruçando sobre a história do mítico museu.
Ela explica, que o prédio começou a ser construído em 1959, como anexo do Brasília Palace Hotel, mas inaugurado, somente em 1961.
O projeto estrutural foi assinado pelo calculista e arquiteto Oscar Niemeyer, Joaquim Cardozo e o projeto arquitetônico de um jovem alagoano chamado, Abel Carnauba Accioly, na época funcionário da Novacap como desenhista técnico.
“O resgate do edifício em si, acabou virando a história da própria instituição, que é muito interessante, por ser um dos primeiros espaços públicos da cidade”, destaca Maíra. “Uma história muito rica e muito pouco registrada”, observa.
A importância do MAB para cidade é inegável e se resume tanto pelo seu peso histórico, quanto pela riqueza do acervo composto por mais de 1.300 peças. Todo esse material está sendo recatalogado pela equipe da secretaria. “É um acervo muito valorizado”, comenta o secretário Bartolomeu Rodrigues.
“O MAB foi uma instituição pioneira nessa área”, atesta o jornalista de cultura, Sérgio Moriconi. “Tem que lembrar que, na época em que ele foi criado, havia poucas galerias de artes na cidade”, recorda.
Cinco décadas de preciosidades
Trata-se de um patrimônio artístico moderno e contemporâneo doados ou adquiridos por meios de salões de premiações realizadas no local e que percorre cinco décadas, ou seja, dos anos 50 ao ano de 2001, configurando trabalhos que vão desde pinturas, gravuras, desenhos, fotografias, esculturas, objetos e instalações.
São preciosidades de artistas consagrados nacionalmente e na esfera local como o baiano Rubem Valentim, o gaúcho Iberê Camargo, a polonesa que se radicou no país, Fayga Ostrower, além dos “brasilienses” Bené Fonteles e Athos Bulcão.
Entre os diretores que passaram pelo espaço estão Glênio Lima, André Lafetá e a fluminense de Niterói, Lêda Watson, desde 1973 morando em Brasília. “Eu criei o MAB”, diz a pioneira, sem cerimônias, hoje com 87 anos. “Foram seis meses de luta para montar toda a equipe e estrutura do museu do zero, recuperando as obras que estavam completamente abandonadas”, lembra, orgulhosa.
Lêda, gravurista de talento desde 1969, com prêmios conquistados na Europa, inclusive, ela diz que o empenho do secretário à frente da pasta de cultura é impecável, sobretudo na recuperação de espaços importantes da cidade como o MAB. “Essa gestão está fazendo proeza, fazendo as coisas acontecerem do zero, renascendo das cinzas, isso é um milagre”, elogia.
Além do MAB, outros espaços da cidade estão sendo revigorados nesse período de isolamento social durante a pandemia. É o caso, por exemplo, do Centro Cultural Oscar Niemeyer, uma área que faz parte do complexo arquitetônico da Praça dos Três Poderes, fechado desde 2015.
Com uma área de 432 m², onde comporta duas galerias e um anfiteatro com capacidade para 20 pessoas, o local teve o sistema de rede elétrica e ar condicionado recuperados, além de teto revitalizado. O espaço também ganhou carpete e pintura novos.
“São equipamentos que fazem parte da história da nossa cidade, alguns deles tombados que precisam ser zelados. Essa é a nossa preocupação. Que quando tudo voltar ao normal, a ‘casa’ esteja arrumada”, enfatiza o secretário Bartô.