InícioCEARÁSamilla Aires e as travessias para existir e resistir como mulher trans

Samilla Aires e as travessias para existir e resistir como mulher trans

Rafaela Leite – Ascom SPS – Texto
Juno Braga e Linga Acácio – Fotos

Servidora da SPS, Samilla é uma das personagens apresentadas no documentário Transversais, exibido nesta sexta-feira (19)

Samilla Aires é plural. O sentido figura por dentro e por fora. Nos caminhos para sua militância, seu trabalho e reconhecimento de sua identidade, é ‘nós’ o sujeito que percorre a travessia e alcança seu lugar. “Eu sempre falo no geral, porque não sinto que percorro só”, conta. “Na posição que estou, carrego a história de muitas meninas. Histórias de dores, muitas mortes e muito movimento”. Entre os trajetos que marcam sua narrativa, o primeiro foi a transexualidade.

Hoje, aos 38 anos, ela explica que nasceu realmente há 21, “na virada do milênio”. “Antes disso, a Samilla já existia, mas habitava em outro corpo, em outra consciência que não era a minha”. Orientadora da coordenadoria LGBT da Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS), ela é uma das cinco personagens que compõem o longa-metragem Transversais, dirigido por Émerson Maranhão e que entra em cartaz no Dragão do Mar, nesta sexta-feira (19).

Ao longo da obra, está não apenas sua história, mas uma realidade de superação que traduz incertezas, lutas e possibilidades para muitas mulheres trans no Ceará. “A gente se reconhece mulher desde muito cedo. As dificuldades que enfrentava eram da não aceitação, de ser essa mulher num corpo que era lido pela sociedade, pela medicina e pela igreja como o corpo de um homem”. O fato resultou em uma série de questões, que se acentuavam pelas crenças que lhe foram ensinadas desde a infância. “Só com educação é que fui compreender qual era meu lugar. Onde eu estava, como eu estava inserida”, lembra.

A maior parte do processo foi lento, em meio ao distanciamento de convenções, do seio familiar, e da necessidade de viver a mulher que existia dentro daquele corpo. A participação em movimentos sociais teve um papel fundamental na compreensão de quem era. Foi a militância também um divisor de águas em sua trajetória profissional. “Eu devo todo o trabalho que é feito hoje na coordenação, inclusive a coordenação e o cargo que ocupo, ao movimento social. Foi de lá que eu vim, militei, me visibilizei”.

O documentário nasceu também nesse meio. Foi na militância onde Samilla conheceu Émerson Maranhão, enquanto ele atuava como jornalista. Entre matérias e trabalhos realizados em conjunto, surgiu a oportunidade do primeiro documentário, realizado no formato web, em 2014.

Hoje, no trabalho e no longa, o sentimento é de orgulho e de responsabilidade. Ela relata um episódio, em 2012, durante a aprovação de uma resolução, pelo Conselho de Educação, para o nome social. “Eu era representante do movimento trans. Lembro de ter pego no braço da secretária e ter dito que ela não tinha noção de como aquela assinatura iria mudar a vida de milhares de meninas trans em todo o Ceará. Hoje eu levo isso: a importância e o peso que têm o trabalho que nós fazemos para as pessoas”.

Em 2013, Samilla assumiu a Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual do município de Pacatuba. O convite para compor a coordenadoria LGBT da SPS veio seis anos depois. “A população trans é uma população que é excluída em todos os setores, sejam eles públicos ou privados. A gente conseguir um lugar, não é por mérito, é por uma construção mesmo. Uma construção de história, que não é só minha”, pondera. “Quando se está em cargo de gestão, existe uma responsabilidade social de cuidar da vida das pessoas, de qualificar suas vidas”.

Transversais

O caminho para a realização do filme foi longo. Entre censura, resistência e vitórias, a série, pensada inicialmente em cinco episódios, se transformou em um longa. A obra aborda a temática transexualidade em uma pluralidade de vozes e experiências, apresentando depoimentos de mulheres e homens trans e ativistas/militantes.

“Transversais é um dos primeiros filmes que trazem a temática trans em formato longa e com delicadeza. O Émerson consegue extrair, com muita sensibilidade, a essência de cada personagem do filme”, relata Samilla. “Eu poderia definir o filme com uma só palavra: esperança. De que é possível vencer, de força, porque nós somos resilientes, aguerrides”.

O documentário abre a 15ª edição do Festival For Rainbow – Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual e de Gênero, na sexta-feira (19), no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. Com produção de Allan Deberton, a obra fará parte da Mostra Competitiva Internacional de Curtas e Longas-metragens. Os ingressos são limitados, e estarão disponíveis no dia do evento em ingresso.com. A exibição terá início às 18h40.

No total, a programação contará com 30 horas de exibição de filmes nacionais e estrangeiros, curtas e longas-metragens em diferentes mostras. Além do audiovisual, o festival terá também apresentações de teatro, performances, dança, música, literatura e debates.

Fonte: Governo do Estado do Ceará

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