Uma das mais antigas cidades do Estado, a pequena Santa Cruz de Goiás é considerada a porta dos colonizadores do sertão goiano, na primeira metade do século XVIII. A abundância de ouro na região levou à fixação das primeiras famílias e ao crescimento do povoado. A decadência veio com o esgotamento do metal. Mas a importância histórica da cidade ainda pode ser vista em alguns casarões do período colonial.
Também segue viva no patrimônio imaterial. Lei, que teve origem em projeto do deputado Gustavo Sebba (PSDB), representante da região na Assembleia Legislativa de Goiás, reconheceu as Cavalhadas e a Contradança de Santa Cruz de Goiás como patrimônio histórico e cultural goiano.
Assim como grande parte das cidades brasileiras, Santa Cruz de Goiás tem suas origens relacionadas a uma atividade econômica. Ainda no período colonial, quando entradas e bandeiras, que partiam, principalmente da Capitania de São Paulo e se aventuravam pelo sertão do país, teve início o processo de constituição do município.
Segundo a professora Fátima Paraguassu, historiadora, autora de cinco livros sobre a cidade, ao adentrar o território, que mais tarde seria o Estado de Goiás, um grupo descobriu, na região de Santa Cruz, grande quantidade de ouro e de muito boa qualidade. Além do ouro superficial (de aluvião), também havia muito mineral encravado em um morro, nomeado de Clemente, em alusão ao homem que o teria descoberto. Se ali havia a riqueza buscada pelos portugueses, o grupo estabelecido não parecia estar muito afinado aos interesses da Coroa.
Fátima Paraguassu observa que o grupo era um tipo de ‘sócio’ do rei, não mandava muita coisa para Lisboa. Tudo era pretexto para protestos e conflitos. Manoel Dias da Silva, companheiro do Anhanguera [Bartolomeu Bueno da Silva, bandeirante que desbravou a região], gozava de prestígio, era quem poderia pacificar os amotinados por sua força moral. Anhanguera o nomeou para a árdua missão, principalmente no Sul onde a onda de turbulência e imoralidade estava desenfreada.
“Viva El Rei!”
A historiadora diz que Manoel Dias da Silva, homem fervoroso, ao deparar com ouro de altíssimo valor fincou uma cruz no local com os dizeres: ‘Viva El Rei de Portugal’ e afirmou que ali seria o futuro arraial de Santa Cruz.
O dia 27 de agosto do ano de 1729 marca oficialmente a ocupação do território, que nessa época, era muito maior que a área atual do município de Santa Cruz de Goiás, abrangendo até a região conhecida por Triângulo Mineiro, posteriormente integrada ao Estado de Minas Gerais. De acordo com Cleusa Maria da Silva, em seu artigo “Fragmentação Territorial da Antiga Província de Santa Cruz de Goiás”, as bandeiras e entradas fomentaram a formação de inúmeras cidades, como o caso de Santa Cruz de Goiás, que deu nome à antiga província e, depois, Estado de Goiás. “Essa foi a forma como se deu a ocupação e, posteriormente, a fragmentação do território que resultou na formação de vários munícipios”, escreveu a professora da Universidade Estadual de Goiás (UEG).
A busca do metal precioso acabou provocando a ida de um contingente maior de pessoas para o arraial.
Fátima Paraguassu explica que, após a formação do núcleo urbano, nos primórdios de Santa Cruz, praticamente todos os séculos XVIII e XIX, o local foi um importante entreposto entre o sertão dos Goyases e o litoral brasileiro. Pela cidade passava a “picada de Goiás” que ligava Cuiabá, Vila Boa (cidade de Goiás), Meia Ponte (Pirenópolis), Triangulo Mineiro e São Paulo.
Em uma de suas obras sobre a cidade, “Santa Cruz de Goiás, a veneranda dama antiga do Sul goiano”, escrita em coautoria com o pesquisador Bento Fleury Curado, Paraguassu cita que José Júlio Guimarães Lima sinaliza que “Santa Cruz representa na história de Goiás, o grande marco de partida para as conquistas civilizadoras que transformaram um sertão deserto nessa colmeia maravilhosa que é hoje todo o sul do Estado de Goiás”.
Mas o apogeu da extração aurífera não durou muito. A pesquisa de Cleusa Maria aponta, ainda, que além da escassez do ouro, outro fato provocou a decadência de Santa Cruz de Goiás. “Uma epidemia de tifo assolou a região e a mina foi interditada em 1768. Morreu quase toda a população, mas apesar da interdição continuou o afluxo de garimpeiros para o local. (…) Com a criação da Capitania de Goiás em 1744 e com a chegada do governador em 1749, Goiás ganhou uma nova dinâmica, aumentou o contingente populacional, o que propiciou o desenvolvimento do comércio e da urbanização. A mineração teve uma duração efêmera e com o esgotamento do ouro, a atividade entrou em declínio e a pecuária, que esteve presente nas regiões das minas, tornou-se a principal atividade econômica de Goiás, dando continuidade ao processo de ocupação”, ensina.
Cleusa Maria anota que Santa Cruz de Goiás acabou dando origem a outras cidades da região, já que de lá, saíram várias pessoas que foram ocupar outras áreas e formar novos centros urbanos no sudeste de Goiás, a exemplo de Orizona e Cristianópolis.
Importância histórica
Se o período entre a “ascenção e a queda” de Santa Cruz foi relativamente curto, a cidade da cruz dedicada ao rei carrega uma herança de pioneirismo para o Estado. “Santa Cruz foi palco de encenação da primeira cavalhada de Goiás, em 1816. Santa Cruz serviu de laboratório para as primeiras práticas museológicas goianas. Santa Cruz foi palco das primeiras práticas musicais de Goiás. Em Santa Cruz aconteceu o primeiro julgamento do Tribunal do Júri e a cidade foi capital da província de Goiás”, enumera a professora Fátima Paraguassu.
A pesquisadora enfatiza que sua pesquisa sobre a cidade continua junto à Associação dos Amigos de Santa Cruz e outros pesquisadores. E cita o próprio livro “Santa Cruz de Goiás, a veneranda dama antiga do Sul goiano” como um importante registro, dentre outros, da história do município.
Sobre a preservação do patrimônio histórico, a professora mostra um certo desânimo. “O patrimônio imaterial segue seu curso, resiste. O material há preservações, por parte da população que valoriza vestígios históricos. Há destruição por parte de quem alija aquilo que é velho. Um dos importantes vestígios da história é a Casa de Câmara e Cadeia, tombada pelo Estado. Sua precariedade assusta e traz desalento.”
Ela conta que em 2009, por intermédio da Associação dos Amigos de Santa Cruz, o Estado entregou ao município o prédio da cadeia restaurado, em perfeito funcionamento. Mas por falta de manutenção, está novamente em péssimo estado. “Há no munícipio 14 sítios históricos e arqueológicos sem nenhuma medida protetiva e preservativa. A cidade de Santa Cruz de Goiás é um dos 14 sítios. Cada rua, cada casa, cada canto do município conta-nos uma instigante história. Não há política de preservação, não há plano diretor e tampouco trabalho de abordagem sobre o valor histórico e cultural do município’, lamenta a professora.
Apesar desses desalentos, Fátima Paraguassu demonstra um grande orgulho de sua terra natal e sublinha que Santa Cruz tem muito para ser visto, admirado e desfrutado. “Em Santa Cruz de Goiás, há um perfeito encontro entre a riqueza histórica, cultural e religiosa com eocoturismo. As águas serenas do Rio do Peixe, com paisagens exuberantes e lindas cachoeiras conquistam os turistas. A cachoeira do Ló, localizada a apenas, cinco quilômetros da cidade, chama a atenção com suas águas cristalinas e saltos de 30 metros de altura. A cachoeira Taboão é outro grande atrativo com sua sequência de quedas: a primeira tem saltos que chegam a seis metros. À beira do muro, de pedra, de até 15 metros de altura, esculpido de forma natural pela água, em tempos remotos, descem pequenas ondas perenes sobre extensa vala de formações rochosas. A segunda queda d’água é encontrada após uma descida de cerca de 260 metros e dá acesso à represa das cachoeiras. Um trampolim natural de pedra, de quase quatro metros de altura, faz a alegria dos banhistas”, descreve.
Ela segue contando das inúmeras opções de diversão que o município oferece, como os passeios “incríveis e desafiadores” em trilhas para pedal ecológico, aventuras super-radicais nos variados rapéis, nas cachoeiras; nas trilhas de moto na região serrana e na descida de caiaque e bote pelas águas do rio do Peixe.
E ainda tem as manifestações culturais e religiosas. “Entre os folguedos folclóricos e religiosos estão as folias de Santos Reis e do Divino Espírito Santo, a contradança (a única manifestação cultural com este sotaque no Brasil); o batuque, além das tradicionais cavalhadas”, relata Paraguassu.
Potencialidades
O representante de Santa Cruz na Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), deputado Gustavo Sebba (PSDB), também enxerga no município um sem fim de possibilidades que podem gerar divisas para o povo santa-cruzense. “Vejo Santa Cruz como um município com muitas potencialidades que podem ser exploradas se bem administradas. Há muito potencial na agricultura, pecuária, turismo cultural e rural e recursos naturais. A cidade apresenta grandes oportunidades. Santa Cruz de Goiás é conhecida por sua arquitetura histórica e patrimônio cultural”
Sebba diz acreditar que a preservação do patrimônio histórico é fundamental para garantir a continuidade da herança cultural e identidade coletiva, além do aspecto econômico. “Esses locais carregam consigo a história, valores e tradições das gerações passadas. Além disso, eles têm potencial econômico, atraindo turistas e gerando empregos locais. Ao conservar essas cidades, estamos preservando nossa história viva para as futuras gerações, promovendo o respeito à diversidade cultural e um senso de pertencimento.”
Na Alego o parlamentar tem trabalhado no sentido de colaborar na preservação do patrimônio histórico e cultural do município. “Apresentei vários projetos para beneficiar a cidade de Santa Cruz. Três deles foram aprovados. Entre eles, o projeto que reconheceu as Cavalhadas e a Contradança de Santa Cruz de Goiás como patrimônio histórico e cultural goiano, com inscrição no Livro de Registro do Patrimônio Imaterial do Estado de Goiás. Além disso, apresentei um projeto que concedeu a Santa Cruz o posto de capital simbólica do Estado. Todos os anos, na semana do dia 27 de agosto, data do aniversário da cidade, os Poderes do Estado funcionarão ali, simbolicamente”, elenca Gustavo.
O deputado revela que tem auxiliado Santa Cruz em outras áreas, com a destinação de várias emendas, que totalizaram R$ 195 mil para as áreas de saúde e infraestrutura.
Nessa data festiva, o parlamentar aproveita para cumprimentar a população de Santa Cruz. “É com grande alegria que parabenizo a querida cidade de Santa Cruz de Goiás pelo seu aniversário! Nesta data especial, reafirmamos o nosso compromisso em continuar trabalhando pelo progresso e desenvolvimento dessa comunidade incrível. Que os laços que unem os cidadãos desta cidade se fortaleçam cada vez mais, trazendo prosperidade, paz e oportunidades para todos. Feliz aniversário, Santa Cruz de Goiás!”
*Nota sobre a professora Fátima Paraguassu
Aparecida Teixeira de Fátima Paraguassu é nascida em Santa Cruz de Goiás. É poetisa, historiadora, escritora, pesquisadora, musicista, violonista, cantora, primeira mulher vereadora e primeira mulher presidente da Câmara de Santa Cruz de Goiás. Escreveu cinco livros sobre Santa Cruz: “Vocabulário de Palavras e Expressões de Santa Cruz de Goiás”, “Real e Imaginário: Aspectos das Culturas Populares em Goiás”, “Imperador Cristão: Aspectos das Culturas Populares em Goiás”, “Santa Cruz de Goiás, a veneranda dama antiga do Sul goiano” (em parceria com Bento Fleury Curado) e “Contradança” (áudio e livro). Foi presidente e, atualmente, secretária na Associação dos Amigos de Santa Cruz, mantenedora do site www.santacruzdegoias.net, página pessoal sobre a cidade no Facebook e Instagram. É sócia titular do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG), acadêmica da Academia de Letras, Arte e História de Pires do Rio, Academia de Letras de Aparecida de Goiânia, Academia de Letras do Brasil, seccional DF. Foi titular do Colegiado Nacional de Culturas Populares do Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC) representando a região Centro-Oeste do Brasil.
Fonte: Portal da Alego
Fonte: Agência Assembleia de Notícias