O subprocurador geral de Justiça do Rio de Janeiro, Ricardo Ribeiro Martins, disse que a organização criminosa denunciada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), que atuava na Prefeitura do Rio de Janeiro conseguiu arrecadar, pelo menos, R$ 50 milhões em propinas pagas por empresas de fachada, que apresentavam notas fiscais para pagamento por meio do sistema de restos a pagar do orçamento do município. O valor está sendo pedido pelo MPRJ em indenização à prefeitura. De acordo com Martins, além do crime de organização criminosa, e da lavagem de dinheiro, o esquema praticava corrupção ativa por parte de empresários e a corrupção passiva com os políticos. “Foram em diversas ocasiões com os pagamentos mensais”, indicou em coletiva no MPRJ.
Martins informou que a denúncia de 280 páginas não foi apresentada antes porque estava incompleta. As investigações continuaram e “aos 45 do segundo tempo” surgiu um a colaboração fundamental com informações relevantes que permitiram a apresentação com os sete pedidos de prisão temporária, entre elas a do prefeito do Rio Marcelo Crivella. Além dos mandados de prisão, a desembargadora Rosa Helena Penna Macedo Guita acatou o pedido do MPRJ de afastamento de Marcelo Crivella do cargo de prefeito.
Ainda segundo o subprocurador, era preciso botar algum obstáculo no esquema criminoso, que na visão dele não encerraria com o fim do mandato de Crivella no dia 31 deste mês. “A prisão preventiva se mostrava necessária, porque nós entendemos que essa organização criminosa não se esgotaria com o término do mandato. Ela se estenderia até porque os processos de lavagem de dinheiro, os processos de arrecadação, se perpetuam. Eles não paralisariam no dia 31 de dezembro agora. Tudo indica, e há prova nos autos, que esses processos vão prosseguir”, afirmou, lembrando que embora não fosse mais utilizar o sistema de restos a pagar do orçamento da prefeitura, que era uma das fontes de propina, a ocultação de bens e a dissimulação do patrimônio continuam nos processos de lavagem de dinheiro.
O subprocurador acrescentou que existem muitas situações em que apesar de presos, os envolvidos continuam a participar dos crimes. “Mesmo depois de duas ações de busca e apreensão, uma, pouco antes da pandemia, e outra já em setembro, as atividades criminosas não cessaram. Não há porque acreditar que isso não vai acontecer no dia 31 de dezembro”, observou, destacando que apesar de não ser uma ação violenta, os atos praticados pelos envolvidos no esquema atingem toda uma coletividade.
“Como está na denúncia, apesar de toda a situação de penúria da prefeitura que hoje não tem dinheiro para pagar nem o décimo terceiro, muitos pagamentos sem nenhum critério de prioridade eram efetuados, exatamente em razão da propina em detrimento até de pagamentos de organizações sociais que reclamavam de atrasos. Essas organizações que administram hospitais. Isso é recorrente”.
Martins rejeitou qualquer caráter político na decretação da prisão do prefeito Crivella e contestou críticas de que a operação se transformou em um espetáculo. “Não há nenhum viés, nenhum prazer nisso. Inclusive estou aqui para esclarecer isso. Acusações de perseguição política. É muita teoria da conspiração achar que o Ministério Público e a Polícia Civil, estão juntos contra fulano ou beltrano por questões políticas.Não tem nada disso”, assegurou.
Ao chegar às 6h35 na Cidade da Polícia, o prefeito atribuiu a sua prisão a uma perseguição política.
“Perseguição política. Lutei contra o pedágio ilegal e injusto, tirei recursos do carnaval, negociei com o VLT. Foi o governo que mais atuou contra a corrupção no Rio de Janeiro”, disse, acrescentando que a sua expectativa agora é “Justiça”.
O advogado Alberto Sampaio, que defende Crivella, disse ao sair da Cidade da Polícia, onde foi acompanhar o cliente, que o prefeito foi surpreendido com a prisão.
De acordo com Martins, as investigações começaram antes do prefeito assumir o cargo. Com base nos depoimentos prestados em delação doleiro Sérgio Misrahy, o MPRJ incluiu na denúncia que a empreitada criminosa teria se intensificado em 2016, durante a campanha eleitoral de Marcelo Crivella, época em que um dos empresários denunciados pediu que ele providenciasse contas bancárias pelas quais pudesse receber dinheiro em espécie para serem utilizadas na campanha. O doleiro, ainda conforme os seus relatos, esteve por diversas vezes para entregar ao empresário, chamado pelo procurador de longa manus do prefeito, o dinheiro obtido nas operações de troca de cheques mediante cobrança de taxa de serviço. A expressão em latim significa braço longo ou o executor das ordens.
Martins lembrou que depois que o prefeito assumiu o cargo, esse empresário passou a ocupar uma sala na sede da Riotur, empresa de turismo do município, ainda que não tivesse cargo na administração. O empresário, segundo a denúncia, era próximo e costumava trocar mensagens de WhatsApp com Crivella. Essas mensagens foram obtidas nas operações com a apreensão de celulares e quebra de sigilo, inclusive com a recuperação de mensagens apagadas. O subprocurador contou ainda que durante uma operação de busca e apreensão o prefeito apresentou um celular que não era dele, o que foi entendido como uma forma de atrapalhar as investigações.
Depois de passar quase seis horas na Delegacia Fazendária, na Cidade da Polícia, no Jacaré, zona norte do Rio, onde prestou depoimento, o prefeito foi levado para o Instituto Médico Legal (IML) para exame de corpo de delito. Em seguida, foi encaminhado ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) onde seria realizada, a partir das 15h, a audiência de custódia de todos os denunciados presos hoje no desdobramento da Operação Hades, que apura corrupção na Prefeitura do Rio e tem como por base a delação do doleiro Sergio Mizrahy.
Edição: Liliane Farias