Às vésperas do Dia Internacional da Menina – celebrado em 11 de outubro – e em uma semana em que as mulheres brilharam nas premiações do Nobel de Física, Química e Literatura, o recado às brasileiras vem do escritor e professor do Instituto de Física, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Alan Alves.
”Acreditem nos sonhos e não negociem os sonhos de vocês. Eu acho muito importante fortalecer a autoestima, acreditar que são capazes, construir o sonho olhando em volta, coletivamente, com as pessoas que estão próximas para proteger, como professores. Acreditem na escola, na escola pública, sobretudo. E sonhem. Lembrem que antes de vocês, outras pessoas vieram e vocês não estão sozinhas.”
Inspirado em garotas que amam a ciência, ele criou a personagem Antonia. Uma menina negra, com altas habilidades, que estuda em escola pública e é apaixonada por astronomia.
A história virou o livro Antonia e a Caça ao Tesouro Cósmico, escrito a partir de experiências pessoais de Allan, mas com a intenção de inspirar meninas Brasil afora.
”Costumo dizer que é autobiográfico, um menino negro que não se via representado nos livros de ciência. Às ciências exatas ainda falta muito essa diversidade. Eu quis trazer uma menina negra, do interior da Bahia, que tem sotaque e fala ‘oxente’, com altas habilidades, inteligente, que faz perguntas incríveis sobre como o universo se formou, o que acontece com as estrelas. Tinha, desde o início, a preocupação de trazer esta representatividade negra que falta nas carreiras científicas.”
Além de trazer a representatividade negra às carreiras científicas e destacar como transformador o ambiente escolar, o pesquisador toca em um ponto que Andrea Ghez, Emannuelle Charpentier e Jennifer Doudna reforçaram ao comemorar o Nobel de Física e Química, respectivamente, nesta semana.
Mulheres na ciência são espelhos para as meninas que hoje ainda estão em idade escolar.
Mas, para a igualdade de gênero em áreas científicas e, mais especificamente, em profissões ligadas ao espaço, a caminhada é longa, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).
De acordo com a Unoosa – Escritório das Nações Unidas para o Espaço Exterior – a representatividade das mulheres em áreas ligadas à astronomia é de 20%, enquanto os homens são 80% dessa força de trabalho.
No Brasil, projetos como o Meninas no Mast – Museu de Astronomia e Ciências Afins, em parceria com o Observatório Nacional, buscam ampliar a participação feminina em atividades de pré-iniciação científica, realização de pesquisas e divulgação, informa uma das coordenadoras do projeto, Cláudia Matos.
Selecionada no projeto, Yasmin Batista conta que sempre teve habilidade com experimentos em sala de aula e que foi fundamental ter uma escola com estrutura para iniciações científicas. Mesmo sem acreditar que seria possível, ela participou do processo seletivo. “Eu achei que não ia conseguir, mas fiz a seleção de toda forma. Fui chamada e fiquei muito feliz. Encontrei no projeto uma família e desenvolvi bastante”, diz.
Foi a partir do Meninas no Mast que Mylena Larrubia decidiu entrar para a graduação em astronomia, em 2017, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ela conta que assim como Antonia, personagem do livro, o gosto pela astronomia veio desde criança. E que além da afinidade com matemática e ciências, foi na família que ela encontrou o principal apoio.
”Fui criada livre para escolher o que queria. Eu comecei a faculdade logo após o Meninas no Mast, então estava com muito incentivo e acho que depois que entrei na faculdade, isso continuou de todas as partes. O que considero muita sorte, um privilégio”, afirma.
Edição: Graça Adjuto